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Kokura: A cidade que escapou da destruição atômica durante a Segunda Guerra Mundial; história ilustrada

por Rafael Cavacchini Publicado em 04/08/2024
Kokura: A cidade que escapou da destruição atômica durante a Segunda Guerra Mundial; história ilustrada

Kokura, localizada na ponta norte da ilha de Kyushu, no Japão, abrigava um dos maiores arsenais militares do país durante a Segunda Guerra Mundial. Esse fato a colocou como um alvo chave nos planos dos Estados Unidos de utilizar bombas atômicas para encerrar o conflito. Considerada para os lançamentos das bombas nucleares “Fat Man” e “Little Boy”, Kokura conseguiu escapar da devastação completa em ambas as ocasiões.

Hiroshima foi o alvo principal da Operação Centerboard I, pois abrigava dois quartéis-generais do Exército Imperial Japonês e um porto estratégico. Kokura e Nagasaki eram os alvos secundários, caso o bombardeio não saísse como planejado. O coronel Paul Tibbets lançou a bomba atômica “Little Boy” sobre a cidade de seu Boeing B-29 Superfortress Enola Gay às 8h15 do dia 6 de agosto de 1945. A explosão resultante matou instantaneamente entre 70.000 e 80.000 habitantes.

No entanto, se algo tivesse dado errado, Kokura poderia muito bem ter sido o local do lançamento da primeira bomba atômica.

Kokura: O alvo principal da “Fat Man”

A segunda missão, codinome Operation Centerboard II, havia planejado que Kokura fosse o alvo principal da bomba atômica “Fat Man”. Os EUA escolheram a cidade porque abrigava um dos maiores arsenais militares do Japão, que produzia tanto armas químicas quanto convencionais. Na manhã de 9 de agosto de 1945, o Enola Gay voou ao lado do B-29 Laggin’ Dragon para avaliar as condições climáticas para o bombardeio mais tarde naquele dia. Os aviões relataram uma cobertura de nuvens significativa, mas com uma previsão de melhora das condições. No entanto, isso acabou não se concretizando.

Bombas incendiárias de setenta libras caem de dois Boeing B-29 Superfortresses durante um ataque ao Japão, 1945. Foto: Bettmann / Reprodução

Contudo, quando o Major Charles Sweeney, piloto do B-29 Bockscar, sobrevoou Kokura, encontrou uma cobertura de nuvens ainda maior. Uma das exigências para lançar a bomba atômica era que o alvo precisasse ser visto claramente, pois os EUA não confiavam em bombardeios assistidos por radar para uma arma tão perigosa. Após fazer três voos sobre a cidade, esperando por uma abertura nas nuvens, Sweeney relatou que “em nenhum momento o ponto de mira foi visto”. Kokura e seus moradores foram poupados da devastação da bomba atômica.

A decisão de bombardear Nagasaki

Foi a falta de visibilidade em Kokura, juntamente com o esgotamento do combustível do motor, que forçou Sweeney a mudar seu curso para o alvo secundário: Nagasaki. Mesmo assim, a cobertura de nuvens ainda estava causando problemas. No entanto, uma súbita abertura nas nuvens permitiu que Sweeney ganhasse visibilidade do alvo. Então, o piloto aproveitou a oportunidade e lançou com sucesso a “Fat Man” em Nagasaki às 11h02. A bomba explodiu no céu, não exatamente onde deveria, mas isso não reduziu o número de vítimas. Dezenas de milhares de habitantes e trabalhadores das instalações militares próximas perderam suas vidas.

Nuvem de cogumelo sobre Nagasaki, vista de Kōyagi-jima, 9 de agosto de 1945. Foto: Galerie Bilderwelt / Reprodução

O clima teve um impacto significativo na decisão de abandonar Kokura e seguir para Nagasaki, mas houveram outras influências. A cidade vizinha de Yahata foi alvo de bombas incendiárias dos EUA no dia anterior, o que fez com que a fumaça dessas explosões contribuísse para a cobertura de nuvens sobre Kokura. Além disso, um ex-trabalhador siderúrgico de Yahata, Satoru Miyashiro, explicou que a cidade queimou alcatrão de hulha para produzir uma fumaça preta espessa, impedindo os bombardeiros americanos de lançar qualquer coisa.

Kokura no século XXI: um Memorial à paz

Em 1963, Kokura e Yahata passaram a fazer parte da cidade de Kitakyushu. Desde então, Kokura se tornou um memorial ao quase bombardeio atômico. O Parque Kitakyushu abriga o Sino e Monumento Memorial da Bomba Atômica de Nagasaki. Já o Museu da Paz da Cidade de Kitakyushu foi inaugurado em abril de 2022. Essas iniciativas visam manter viva sobretudo a memória dos horrores da guerra e promover a paz.

Kokura, agora parte de Kitakyushu, é um testemunho vivo da sorte e das circunstâncias que a salvaram de uma destruição completa. Ao lembrar desses eventos, a humanidade é instada a buscar caminhos de paz e evitar a repetição de tais tragédias.

O Castelo de Kokura fica aninhado entre edifícios mais novos na cidade de Kitakyushu. Foto: Keramahani / Wikimedia Commons

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Rafael Cavacchini

Rafael Cavacchini

Nascido na cidade de Itu, interior de São Paulo, Rafael Cavacchini é empresário, radialista, jornalista e ator. Apaixonado por arte, é ator de teatros desde 2013, participando em peças que vão de tragédias clássicas a musicais. É também radialista no programa “A Kombi Desgovernada”, sucesso em três estações de rádio desde 2015. Começou a escrever muito cedo, inicialmente por hobby. Mas foi apenas em 2011 que transformou o prazer em profissão, quando entrou para o quadro de jornalistas convidados da Revista SuplementAção. Em 2015, tornou-se colunista no Portal Itu.com.br e, no mesmo ano, jornalista convidado da Revista Endorfina. Foi escritor e tradutor do Partner Program do site Quora, uma rede social de perguntas e respostas e um mercado de conhecimento online, com sede em Mountain View, Califórnia. Sua visibilidade no Quora chamou a atenção da equipe da Revista Sociedade Militar. Faz parte do quadro da RSM desde fevereiro de 2023, tendo escrito centenas de artigos e reportagens.