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Estados Unidos pressionam para rotular PCC e Comando Vermelho como organizações terroristas e enviá-los à prisão brutal de El Salvador — mas governo Lula reage e descarta seguir plano internacional

por Alisson Ficher 09/05/2025
Estados Unidos pressionam para rotular PCC e Comando Vermelho como organizações terroristas e enviá-los à prisão brutal de El Salvador — mas governo Lula reage e descarta seguir plano internacional

Imagine uma prisão onde até 100 homens dividem a mesma cela, sem camas, sem visitas e sem direito à privacidade.

Eles vivem sob vigilância constante, são forçados a se ajoelhar e a olhar para o chão, raspados e algemados, enquanto caminham em silêncio absoluto pelos corredores do complexo.

Essa não é a descrição de um campo de guerra, mas sim de uma penitenciária real que já abriga milhares de detentos considerados irrecuperáveis.

Agora, essa prisão pode estar prestes a receber traficantes de facções brasileiras como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV), detidos em território norte-americano.

Segundo informações do portal ”Metrópoles”, o governo dos Estados Unidos estuda a possibilidade de transferir esses criminosos para o Centro de Confinamento de Terroristas (Cecot), localizado em El Salvador, desde que as facções brasileiras sejam formalmente reconhecidas como organizações terroristas.

Mas a proposta está longe de ser simples e já gera controvérsia internacional.

Cecot: um presídio de proporções colossais

Inaugurado em janeiro de 2023 pelo presidente Nayib Bukele, o Cecot foi criado para ser a prisão mais segura e temida da América Latina.

O presídio surgiu após uma onda brutal de homicídios em 2022, atribuída às gangues MS-13 e Barrio 18, e tornou-se o símbolo máximo da política de “tolerância zero” ao crime em El Salvador.

Localizado no município de Tecoluca, a 74 quilômetros de San Salvador, o complexo ocupa uma área equivalente a mais de 230 campos de futebol e tem capacidade para 40 mil presos.

Sete cercas eletrificadas com sensores de movimento, sistemas de vigilância de última geração, torres de controle e bloqueadores de sinal celular compõem a estrutura de segurança.

Cerca de 1.000 agentes penitenciários, 600 soldados e 250 policiais da tropa de choque mantêm a disciplina no local.

Rotina brutal e ausência de direitos humanos

Dentro das muralhas do Cecot, a vida dos detentos é marcada pela privação total de conforto, dignidade e contato com o mundo exterior.

As celas, com até 100 pessoas, não têm camas nem banheiros privados. Visitas familiares são proibidas, e as refeições são mínimas.

Durante deslocamentos dentro do complexo, os prisioneiros devem permanecer ajoelhados, com o olhar fixo no chão, raspados e acorrentados, mesmo sem terem sido condenados.

Há denúncias de torturas e maus-tratos, inclusive entre presos ainda não julgados.

O governo salvadorenho alega que os detentos do Cecot não são passíveis de ressocialização e, portanto, devem cumprir pena de forma rígida e segregada.

Críticas internacionais e acusações de abusos

Organizações como Human Rights Watch e Anistia Internacional denunciam abusos graves no sistema penitenciário de El Salvador.

Entre as queixas estão prisões arbitrárias, tortura física e psicológica, ausência de acesso a advogados e negação do devido processo legal.

Desde que o presidente Bukele decretou estado de exceção em março de 2022, mais de 75 mil pessoas foram detidas, o equivalente a 2% da população adulta salvadorenha.

No Cecot, estão encarcerados os presos considerados mais perigosos, alguns com penas que somam até 700 anos.

Apesar das críticas, a taxa de homicídios caiu drasticamente no país, o que aumentou a popularidade de Bukele, especialmente entre governos conservadores da América Latina.

Plano dos EUA: transferir presos do PCC e CV

O governo dos Estados Unidos, sob a liderança de Donald Trump, estuda a viabilidade de enviar para o Cecot traficantes ligados ao PCC e CV presos em território americano.

O plano, no entanto, depende de uma reclassificação jurídica dessas facções, que precisariam ser oficialmente reconhecidas como organizações terroristas.

Esse rótulo permitiria a aplicação de sanções mais duras, além de facilitar transferências internacionais de detentos.

Trump já utilizou essa estratégia com grupos como a MS-13, de El Salvador, e a Tren de Aragua, da Venezuela.

Brasil recusa classificar PCC e CV como terroristas

O Brasil, por meio do governo Lula, rejeitou oficialmente a proposta dos Estados Unidos de classificar as facções criminosas PCC e CV como organizações terroristas.

Durante uma reunião com representantes do Departamento de Estado, o secretário nacional de Segurança Pública, Mário Sarrubbo, declarou que essa classificação não é compatível com o sistema jurídico brasileiro.

Não consideramos as facções organizações terroristas“, afirmou Sarrubbo. “Elas não atuam por causa ideológica ou religiosa, mas apenas por interesses econômicos através de crimes diversos.

O governo brasileiro entende que já combate essas facções por meio de políticas públicas, fortalecimento das forças de segurança e cooperação regional com outros países da América Latina.

A negativa frustra os planos norte-americanos de transferência de criminosos brasileiros para o Cecot, já que, sem essa classificação formal, a medida violaria a legislação nacional e tratados internacionais assinados pelo Brasil.

Bukele inspira líderes da direita na América Latina

Apesar das críticas de entidades de direitos humanos, a popularidade de Nayib Bukele e seu modelo de repressão ao crime influenciam líderes conservadores da região.

Países como Honduras, Guatemala e até o Equador demonstraram interesse em adotar métodos semelhantes de controle penitenciário e de segurança pública.

Nos EUA, Trump afirmou recentemente que pretende reabrir a histórica prisão de Alcatraz, fechada em 1963, como símbolo do endurecimento penal.

Futuro incerto para criminosos transnacionais

O destino de membros do PCC e CV detidos nos Estados Unidos continua indefinido. A tentativa de transferi-los para El Salvador depende de decisões políticas e legais complexas, tanto nos EUA quanto no Brasil.

Enquanto isso, o Cecot segue como o retrato mais extremo de um novo modelo penal que prioriza punição em detrimento da reabilitação.

Seja visto como exemplo ou como alerta, o presídio levanta questões cruciais sobre os limites do combate ao crime e os riscos de se abrir mão dos direitos humanos.