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Marinha de novo na berlinda, decisão de Almirante da inteligência é anulada pela Justiça Federal: caso F-35, derrota expõe injustiças no trato com subordinados

por Sociedade Militar Publicado em 07/03/2025
Marinha de novo na berlinda, decisão de Almirante da inteligência é anulada pela Justiça Federal: caso F-35, derrota expõe injustiças no trato com subordinados

A Marinha do Brasil, atualmente comandada pelo Almirante de Esquadra Marcos Sampaio Olsen, tem sido destaque na mídia nas últimas semanas, frequentemente envolvida em polêmicas relacionadas a disputas judiciais, embates com advogados e publicações institucionais controversas.

A Justiça Federal da União publicou nessa quinta-feira (06 de março de 2025) uma decisão com anulação da penalidade aplicada pela Marinha do Brasil a um militar acusado de divulgar uma fotografia de um caça norte-americano modelo F-35, que aterrissou em uma base naval no Rio de Janeiro. A decisão expõe falhas gravíssimas no processo disciplinar conduzido pela Força, apontando violação de princípios constitucionais como ampla defesa e imparcialidade.

Em maio de 2024, uma aeronave F-35C Lightning II da Marinha dos Estados Unidos pousou em procedimento de emergência na Base Aérea Naval de São Pedro da Aldeia, no Rio de Janeiro. O avião participava da Operação Southern Seas 2024, as imagens da aeronave na Base foram compartilhadas milhares de vezes na internet.

Caso gerou punição e transferência do militar

O militar Marcos R. C. S. foi alvo de penalidade em um processo disciplinar controverso, após compartilhar a imagem do caça F35 em um grupo de mensagens. A fotografia já havia circulado amplamente nas redes sociais, mas, ainda assim, o oficial foi punido pelo Contra-Almirante Giovani Corrêa, comandante da inteligência da Marinha. Além da punição, o militar foi desligado da missão na qual estava envolvido e transferido para outra unidade.

Inconformado, o militar ingressou com uma ação na Justiça Federal, contestando a legalidade da medida e alegando cerceamento de defesa. O processo tramitou na 20ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal, tendo como ré a União.

Ouvido pela Revista Sociedade Militar, um dos advogados que atuaram no caso, Dr. Adão Farias, mencionou que a Marinha tentou de todas as formas colocar o processo em segredo de justiça, quando a regra no país é a publicidade. … Almirante agiu de forma arbitrária e ilegal se valendo do seu status de oficial general achando que estava acima da lei, da justiça e da Constituição Federal

Outro dos advogados que atuou na defesa, Dr. Cláudio Lino,  destacou que a força não observou princípios básicos como o contraditório e ampla defesa:

“… sentença que anulou a punição imposta pela Marinha a um militar por compartilhar uma foto não sigilosa representa um marco na defesa dos direitos constitucionais no âmbito militar, expondo falhas graves no processo disciplinar e reafirmando a necessidade de imparcialidade, ampla defesa e respeito ao devido processo legal. Além de beneficiar o militar injustiçado, a decisão serve como um alerta para as Forças Armadas sobre a importância de revisar seus procedimentos disciplinares e garantir a conformidade com a Constituição Federal, contribuindo para um ambiente mais justo e democrático nas instituições militares.”

Afronta ao principio do Juiz natural

Trecho da decisão fala sobre afronta a princípios básicos observados no Brasil: “procedimento disciplinar instaurado foi conduzido de forma arbitrária, sem a instauração de sindicância ou Inquérito Policial Militar (IPM), contrariando normas internas da Marinha (DGPM-315) e o Regulamento Disciplinar da Marinha (RDM). Argumenta que foi punido pelo próprio denunciante, o que configuraria afronta ao princípio do juiz natural e ao devido processo legal.”, consta na decisão.

Decisão judicial aponta falhas no processo disciplinar

Na sentença, a juíza Adverci Rates Mendes de Abreu considerou que a punição foi aplicada de forma arbitrária, sem a devida instauração de sindicância ou Inquérito Policial Militar, contrariando normas da própria Marinha. Outro ponto crucial para a anulação foi o fato de que o mesmo oficial que determinou a punição também foi o responsável por aplicá-la, ferindo o princípio da imparcialidade.

A magistrada destacou ainda que não há nos autos qualquer comprovação de que a imagem compartilhada pelo militar continha informação sigilosa. “A ampla defesa e o contraditório, princípios de observância obrigatória, exigem mais que a mera formalização de resposta, senão que, juntamente consigo, sejam assegurados também os meios e recursos a eles inerentes”, afirmou a juíza na decisão.

“É certo que a atividade militar é pautada pela hierarquia e disciplina, por força de expressa disposição constitucional e legal (artigo 142 da CRFB e artigo 14 da Lei n.º 6.880 /1980) e a punição do infrator visa a preservar a intangibilidade desses princípios, reeducar o militar e desestimular a reiteração da conduta infracional. Entretanto, a Autoridade Militar não está isenta de observar os princípios constitucionais mínimos relativos à legalidade, tipicidade fechada, culpabilidade, imparcialidade, além das correspondentes garantias ligadas ao devido processo legal substancial. “

Impacto e repercussão da decisão

A decisão judicial representa uma derrota para a Marinha do Brasil devido ao alto status e posição destacada do oficial que aplicou a punição, além de reforçar a necessidade de observação rigorosa dos princípios constitucionais nos processos disciplinares militares. Além de anular a penalidade imposta ao militar M. R. C. S., a Justiça determinou que qualquer registro da punição fosse removido do prontuário funcional do militar.

A União também foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios. Questionados pela Revista Sociedade Militar sobre se ônus financeiro causado por esse tipo de injustiça e multas impostas à União recaem sobre a autoridade que cometeu o abuso e não cumpriu a lei da forma correta os advogados responderam que o agente pode ser responsabilizado.

… em tese, havendo comprovação de que a autoridade militar agiu com dolo ou negligência ao conduzir o processo disciplinar de forma irregular, a União poderá buscar o ressarcimento dos valores despendidos com a condenação judicial, por meio de uma ação regressiva. Essa medida é fundamental para garantir a responsabilização dos agentes públicos e evitar que o ônus de seus atos ilícitos recaia sobre toda a sociedade.” (Cláudio Lino)

Robson Augusto – Revista Sociedade Militar

 

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