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JAS-39 Gripen à beira da aposentadoria? O caça da SAAB que já foi símbolo de inovação agora luta para sobreviver em um cenário aéreo dominado por furtividade e inteligência artificial

por Alves 28/03/2025
JAS-39 Gripen à beira da aposentadoria? O caça da SAAB que já foi símbolo de inovação agora luta para sobreviver em um cenário aéreo dominado por furtividade e inteligência artificial

O JAS 39 Gripen, caça desenvolvido pela empresa sueca Saab, foi por muitos anos celebrado como uma opção econômica e versátil frente a aeronaves mais caras e complexas, como o F-35. Criado com o propósito de oferecer poder de combate a países que não poderiam ou não queriam investir em jatos de quinta geração, o Gripen agora encara um cenário de incertezas sobre seu papel no futuro da aviação militar.

Projetado durante a Guerra Fria, o Gripen foi moldado para atender às necessidades específicas da defesa sueca. Na época, a Suécia precisava de um caça capaz de operar a partir de estradas, com rápida manutenção e alta mobilidade, apto a sobreviver mesmo se suas bases aéreas fossem destruídas em um ataque. Essa estratégia de resiliência era ideal para o contexto geopolítico da época, marcado pelo receio de uma ofensiva soviética.

Com o fim da Guerra Fria, o mundo mudou, e as exigências da guerra aérea moderna acompanharam esse movimento. O surgimento de tecnologias furtivas, fusão avançada de sensores e guerra em rede alterou o cenário de combate, exigindo caças mais sofisticados e integrados a sistemas de batalha mais complexos. O Gripen, mesmo com suas atualizações recentes, tem enfrentado dificuldades para se manter relevante frente a essas mudanças.

A versão mais recente do caça, o Gripen E/F, recebeu melhorias importantes, como radar AESA (Active Electronically Scanned Array), novo sistema de guerra eletrônica e um arsenal atualizado de mísseis ar-ar. No papel, essas inovações o colocam no patamar de um caça de geração 4.5. Porém, na prática, sua limitação está na falta de recursos nativos de quinta geração, como a furtividade e a profunda integração com sistemas digitais de combate.

Furtividade, sensores e guerra em rede: por que o Gripen sofre para acompanhar os novos padrões de combate aéreo?

O combate aéreo moderno não é mais definido por dogfights a curta distância. A vitória, muitas vezes, depende de quem vê, atira e elimina o inimigo primeiro — mesmo antes de ser detectado. Nesse ponto, o Gripen e outros caças da mesma geração enfrentam sérias desvantagens. A ausência de um design furtivo nativo reduz a capacidade de surpresa, elemento crucial nos conflitos atuais.

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A comparação com o Eurofighter Typhoon é inevitável. Ambos os caças foram concebidos para batalhas de alta intensidade no cenário da Guerra Fria, mas hoje parecem deslocados diante das necessidades emergentes. O Typhoon, com dois motores e maior autonomia, ainda assim não é furtivo. Se ele já luta para justificar seu uso no campo de batalha contemporâneo, o Gripen, menor e com apenas um motor, encontra ainda mais barreiras para se destacar.

Na era da guerra em rede, a integração entre aeronaves, drones, satélites e centros de comando é fundamental. Plataformas como o F-35 foram pensadas desde o início para atuar nesse tipo de ambiente, o que lhes garante vantagens consideráveis em interoperabilidade. O Gripen, embora adaptado para alguns níveis de integração, não foi concebido com essa prioridade e acaba ficando atrás.

Apesar disso, o Gripen ainda mantém sua utilidade para missões de policiamento aéreo e defesa regional, principalmente em países que não participam de coalizões militares complexas. Seu custo mais acessível e manutenção simplificada são atrativos para forças aéreas que buscam uma solução eficiente para cenários de baixa intensidade.

Países aliados hesitam em adotar o Gripen e priorizam caças mais compatíveis com operações conjuntas

Um dos exemplos mais recentes desse dilema vem do Canadá. O primeiro-ministro Mark Carney sugeriu considerar o Gripen como alternativa ao F-35, alegando menor custo e facilidade de manutenção. No entanto, analistas apontam que essa escolha representaria um erro estratégico para o país.

Para o Canadá, o fator decisivo não é apenas o desempenho isolado do caça, mas sua capacidade de operar em conjunto com parceiros da OTAN e do NORAD. Nesse sentido, o F-35 oferece uma interoperabilidade incomparável, especialmente em termos de comunicações seguras, compartilhamento de dados em tempo real e atuação em missões coordenadas.

Caso o Canadá optasse pelo Gripen, poderia enfrentar dificuldades logísticas e comprometer sua credibilidade de combate em regiões estratégicas como o Ártico, onde sensores avançados e capacidades furtivas são cada vez mais importantes. A decisão envolve, portanto, mais do que economia: trata-se de garantir presença efetiva em ambientes hostis e tecnologicamente avançados.

A realidade é que os custos operacionais mais baixos do Gripen não compensam, em muitos casos, a perda de vantagem tecnológica e tática em um conflito real. Em um eventual confronto contra potências militares bem equipadas, a diferença de capacidades pode ser fatal.

A Europa busca caças de sexta geração enquanto o Gripen tenta se manter no jogo

Enquanto países como Estados Unidos, Reino Unido e outras nações europeias já desenvolvem plataformas de sexta geração — como os projetos NGAD, Tempest e FCAS —, o Gripen luta para não ser deixado para trás. O futuro da guerra aérea envolve inteligência artificial, integração entre sistemas tripulados e não tripulados e coordenação automatizada do campo de batalha.

Nesse cenário, o Gripen parece deslocado. Embora existam especialistas que defendam o uso de guerra eletrônica como forma de neutralizar a vantagem da furtividade, essa visão ignora um ponto central: a furtividade não é apenas invisibilidade, mas o controle sobre como e quando ser detectado.

A estrutura dos caças de quinta geração é projetada desde o início para reduzir a assinatura de radar. Já caças como o Gripen precisam depender de contra-medidas, o que os torna mais vulneráveis. Essa diferença conceitual é fundamental para entender por que o Gripen enfrenta tantas dificuldades para se manter relevante.

Ainda assim, a Saab continua promovendo o Gripen como uma alternativa viável, especialmente para países com orçamentos mais restritos ou com estratégias militares voltadas à defesa territorial. Mas a pressão do avanço tecnológico é constante, e o tempo parece estar se esgotando para a atual geração de caças.

Para quem o Gripen ainda vale a pena? especialistas indicam usos limitados em cenários de baixa complexidade

Em termos práticos, o Gripen continua sendo uma opção aceitável para países que não planejam enfrentar adversários tecnologicamente avançados. Nações que priorizam a soberania do espaço aéreo e missões defensivas de baixa intensidade ainda podem encontrar valor no caça sueco.

Contudo, para forças aéreas que visam atuar em ambientes de alta complexidade, junto a aliados com tecnologia de ponta, a escolha do Gripen representa um risco. A defasagem tecnológica tende a aumentar, e as limitações operacionais podem comprometer toda uma estratégia militar.

A transição global para aeronaves de quinta e sexta geração parece inevitável. A dúvida que permanece é: quantos países ainda estarão dispostos a investir em um avião de combate que, apesar de moderno em alguns aspectos, já nasce em desvantagem no campo de batalha?

A informação foi divulgada por Andrew Latham, colunista do portal 19FortyFive e professor de relações internacionais, que destacou os desafios enfrentados pelo Gripen em um artigo publicado recentemente.

Enquanto os desenvolvimentos tecnológicos aceleram, o futuro do Gripen depende agora da disposição de seus atuais e futuros operadores em aceitarem as limitações da plataforma. O caça sueco, símbolo de inovação nos anos 90, hoje tenta resistir a uma era que exige mais do que apenas ser bom — exige ser o melhor.