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Exército não sabia que 400 brasileiros já treinavam guerrilha em Cuba antes do golpe de 64. CIA já tinha mapeado ameaça em 1963, mas Exército brasileiro continuou com dados equivocados por décadas

por Sérvulo Pimentel Publicado em 22/03/2025
Exército não sabia que 400 brasileiros já treinavam guerrilha em Cuba antes do golpe de 64. CIA já tinha mapeado ameaça em 1963, mas Exército brasileiro continuou com dados equivocados por décadas

Por décadas, o Exército acreditou que apenas 202 brasileiros haviam recebido treinamento de guerrilha em Cuba entre 1965 e 1971. Mas documentos secretos recém-desclassificados dos Arquivos JFK, liberados por ordem de Donald Trump, mudam completamente essa narrativa histórica.

Conforme artigo publicado na Revista Sociedade Militar, um relatório confidencial da CIA, datado de 1963, afirma que cerca de 400 brasileiros viajaram legalmente para Cuba em 1962, bem antes do golpe de 1964, para receber treinamento em guerrilha. A informação desmente a versão que o próprio Exército brasileiro divulgou em um documento de 1972, revelado pela Folha de São Paulo.

Treinamento antes da ditadura

De acordo com os arquivos, os militantes brasileiros não estavam foragidos,, como se costuma pensar, ou em fuga do regime militar, mas saíram do país de maneira regular. “Aproximadamente 400 cidadãos brasileiros viajaram legalmente para Cuba em 1962, e outros 24 nos dois primeiros meses de 1963”, revela o memorando da CIA.

Documentos recém-liberados por Trump mostram que 400 brasileiros, não 202 como acreditava o Exército, viajaram legalmente para Cuba para treinamento guerrilheiro já em 1962, dois anos antes do golpe militar. (Imagem: Reprodução/JFK)

Segundo revelado, militantes que viajaram à Cuba participaram de um programa estruturado que incluía um curso de 11 meses em política geral e depois três meses específicos para o Brasil”. O dado derruba a tese de que a radicalização armada só teria ocorrido após o endurecimento do regime militar.

Rede de guerrilha no Brasil

O relatório americano revela ainda algo mais grave: os treinados tinham como missão estruturar campos de guerrilha no Brasil antes mesmo do golpe. “Pelo menos seis desses campos foram estabelecidos, cada um com 30 homens e um líder treinado em Cuba”, aponta o documento da CIA.

Essa operação, segundo os Arquivos JFK, foi conduzida sob liderança de membros das Ligas Camponesas e do Partido Comunista Brasileiro. Nomes como Clodomir dos Santos Morais, “número dois das Ligas Camponesas”, e Florentino Alcantara de Moraes, líder do PCB em Pernambuco, foram identificados.

Arquivos JFK revelam que guerrilheiros viajaram legalmente a Cuba em 1962; número é o dobro do estimado pelos militares brasileiros. (Foto: Arquivo Nacional)

Exército subestimou os números

Enquanto isso, um álbum confidencial do Exército de 1972, revelado pela Folha de São Paulo, afirmava que Cuba treinou 202 brasileiros entre 1965 e 1971, após o golpe militar. O documento, distribuído aos órgãos de repressão, listava nove turmas de militantes, incluindo nomes como José Dirceu, Fernando Gabeira e Carlos Minc.

O material descrevia cursos que iam de guerrilha rural a explosivos, mas agora sabe-se que o número de brasileiros treinados era pelo menos o dobro e começou bem antes de 1964.

Operação continental revelada

Os documentos liberados por ordem do presidente Trump em março de 2025 revelam ainda uma operação continental coordenada por Cuba, não limitada ao Brasil.

A rede abrangia Argentina, Colômbia, República Dominicana, Chile e diversos outros países latino-americanos, evidenciando o alcance da influência cubana durante a Guerra Fria.

As informações agora disponíveis nos Arquivos Nacionais dos EUA podem alterar significativamente a compreensão das motivações e circunstâncias que levaram à deposição do presidente João Goulart.

Sérvulo Pimentel

Sérvulo Pimentel