Exército promete capacitação, mas jovens enfrentam batalha contra o alto desemprego no mercado de trabalho

Ano após ano, milhares de jovens deixam o serviço militar e retornam à vida civil. O discurso oficial do Exército pinta um quadro bonito: soldados preparados, disciplinados, prontos para encarar os desafios do mercado de trabalho. Mas, na prática, será que essas iniciativas realmente resolvem os problemas de inserção profissional? Ou apenas empurram os jovens para uma batalha diferente, agora contra o desemprego?
O Projeto Soldado Cidadão, anunciado com pompa desde 2004, promete capacitar os recrutas que serviram entre um e oito anos nas Forças Armadas, ajudando-os a voltar à vida civil. Em teoria, isso soa incrível mas, na prática, o impacto é muito mais complicado. Apesar dos cursos oferecidos e das parcerias com empresas privadas, muitos questionam se essas iniciativas do Exército realmente preparam os jovens para competir em um mercado de trabalho saturado e com altos níveis de desemprego.
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Em Curitiba, a Agência do Trabalhador cadastrou cerca de mil militares que estão de saída do Exército. De acordo com o gerente da agência, Rafael Santos, “as empresas têm interesse nesses militares por causa da disciplina, respeito à hierarquia, assiduidade, pontualidade, e toda a parte comportamental que hoje é difícil de encontrar, principalmente entre os mais jovens”.

No entanto, a questão que se impõe é: será que esses valores realmente são suficientes para garantir emprego em um país com mais de 7,9 milhões de desempregados? O soldado Pedro Henrique Moro, por exemplo, quer trabalhar na área do Direito, onde o mercado é altamente competitivo. Já Júlio Gustavo da Rocha Petrak, graduado em Administração, espera que a experiência no Exército o diferencie dos demais. Mas em setores saturados como esses, a disciplina militar será mesmo um diferencial tão decisivo?
Em Natal, durante a 2ª Feira de Empregabilidade, cerca de 900 militares foram cadastrados para 600 vagas imediatas. Parece positivo, mas não deixa de ser um jogo de números apertados. Além disso, fica a dúvida: quantos desses jovens terão acesso a empregos estáveis e com bons salários? E mais: quantos serão empurrados para posições precarizadas, onde a “disciplina” se torna um adjetivo bonito para justificar baixos salários?
Disciplina militar versus realidade civil
A narrativa oficial gosta de exaltar as qualidades adquiridas no serviço militar: disciplina, assiduidade, respeito à hierarquia. Mas será que essas características, por si só, são suficientes para sobreviver no mercado civil? O desemprego no Brasil é estrutural, e muitos jovens acabam aceitando empregos informais ou mal remunerados, mesmo após passarem por essas “capacitações”.
Além disso, a transição do ambiente hierárquico do Exército para a flexibilidade exigida em muitos empregos civis pode ser desafiadora. A disciplina militar é, sem dúvida, uma qualidade valiosa, mas não substitui competências técnicas avançadas ou experiência em áreas específicas.
O soldado Júlio resumiu bem o aprendizado que levou da vida militar: “Acredito que vou levar bastante aprendizado, a disciplina e o espírito de corpo.” O desafio, no entanto, será transformar essas qualidades em algo que o mercado civil realmente valorize — e isso está longe de ser uma batalha fácil de vencer.