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Ninguém sabe o que fazer com a mansão do líder nazista que se transformou em um estorvo para o governo alemão: é muito cara, perigosa e guarda histórias sombrias

por Anna Munhoz Publicado em 14/08/2024
Ninguém sabe o que fazer com a mansão do líder nazista que se transformou em um estorvo para o governo alemão: é muito cara, perigosa e guarda histórias sombrias

Ninguém sabe o que fazer com a antiga casa do ex-líder da propaganda do governo nazista, Joseph Goebbels, situada a uma hora ao norte de Berlim. O fato é que o governo alemão quer se livrar da propriedade porque ela é cara demais para ser mantida e perigosa demais para ser vendida. Isso sem falar na história macabra que circunda o local, já que Joseph e sua esposa envenenaram os seis filhos nos últimos dias da guerra.

Estima-se que a mansão custe cerca de 280 mil euros por ano, o equivalente a R$ 1,7 milhão apenas para ficar de pé, sem nenhum tipo de intervenção ou benfeitoria. Esse, inclusive, é outro dilema, uma vez que se a casa for restaurada, o legado nazista é reestetizado. A mansão está repleta de elementos arquitetônicos muito utilizados pelos líderes nazistas.

Construída ao lado do lago Bogensee, em Brandenburgo, a casa apodrece e se deteriora lentamente. A principio, o imóvel foi um “presente” oferecido pouco antes do inicio da segunda guerra mundial. Posteriormente, o partido comunista construí diversos dormitórios no local que serviriam para abrigar uma escola de doutrinação.

O local possui cerca de oito hectares, o equivalente a 11 campos de futebol, retratando o passado de dois regimes autoritários. Contaminada pela história e custando caro aos cofres públicos, Berlim simplesmente desistiu de vendê-la ou utilizá-la para outro fim.

Como parte da solução, o governo ofereceu a mansão nazista para doação, totalmente gratuita, onde o destinatário estaria sujeito a aprovação. Contudo, isso também é um problema, já que o governo quer manter afastado a todo custo os líderes de extrema direita ou que ainda se ligam aos ideais nazistas.

O senador estadual para finanças, Stefan Evers, fez um discurso desesperado ao Parlamento com a proposta. “Tirem isso de nossas mãos, ou nós a demoliremos”.

“A história do lugar é precisamente a razão pela qual Berlim nunca entregaria este edifício a mãos privadas em que haveria o risco de que ele pudesse ser mal utilizado”, enfatizou Evers.

Preservar ou apagar o passado alemão?

A casa do ex-líder nazista levanta uma questão muito delicada para a Alemanha que não se resume apenas a um dilema logístico. A preservação ou a eliminação dos muitos edifícios que narram o passado odioso do país é alvo de fundamentos e teorias que mudam ao longo do tempo, especialmente no sentido de afastar simpatizantes nazistas que, por vezes, costumam fazer peregrinações a esses locais.

Com o fim da segunda guerra, o protocolo era apenas “seguir em frente”, ignorando tudo o que ficou para trás, conforme conta o historiador e autor de “Goebbels”, Peter Longerich. O apartamento de Hitler em Munique, por exemplo, tem poucas informações detalhando sua história. “Por lá, há muito tempo funciona uma delegacia de polícia na qual os oficiais ainda usam as próprias estantes de madeira de Hitler”, disse ele.

Contudo, na medida em que a extrema-direita voltou a crescer na política alemã, houve uma mudança de sentimento em direção a lembrar o passado, para nunca esquecê-lo. “A atitude dominante na educação por muito tempo foi, se possível, ignorar muitas coisas desse período”, disse Longerich. “Mas ninguém tem um maior senso de lidar com o passado do que os alemães, então há um processo contínuo”, acrescentou. “E pode ser que, com o tempo, a ignorância precise ser superada e as pessoas achem necessário preservar este espaço.”

Centro de Educação

Uma das possíveis alternativas, encarada com bons olhos pelo governo alemão, é a possibilidade de transformar o local em um centro de educação. A proposta é do rabino Menachem Margolin, presidente da Associação Judaica Europeia. O rabino chegou a enviar uma carta aberta onde propõe convertê-la em um centro de educação para combater todas as formas de ódio.

“É uma mensagem importante para todos”, disse Margolin. “Que mesmo o lugar mais sombrio do mundo pode se tornar uma fonte de luz.”

Para o senador Evers, a proposta é interessante, mas o problema é o financiamento para isso. Para Walter Reich, ex-diretor do Museu Memorial do Holocausto dos Estados Unidos, essa deveria ser uma obrigação da Alemanha. “Isso faz parte do fardo da história alemã”, disse Reich em um e-mail. “O passado imponderável da Alemanha.”

*Com informações do New York Times (NYT).

Anna Munhoz

Anna Munhoz

Jornalista e redatora com foco em concursos públicos, atualidades e segurança. Olhar atento a um conteúdo claro, útil e de confiança.